sábado, 9 de julho de 2011

Borderline

Vive num pequeno e frágil mundo de cristal, olhando por entre as vítreas paredes do seu refúgio, para toda a realidade que o circunda, tentando agarrar firmemente um fragmento desse mundo, para que no momento seguinte o perca e perante os seus olhos veja afastar-se toda aquela vida que o abraçou....um pouco. A vida gira em seu torno, bailando a leves passos intacta e crua, agitando-se, aproximando-se, ondulando no seu horizonte! Num impulso de terror , estende o seu braço num gesto de desespero, á procura de um sopro de amor (um apoio emocional).

Quando finalmente um pedaço de amor poisa sobe o seu mundo, os receios entranham na sua mente , teme o abandono, ficar novamente só...E quando tudo parece tão estável, tão harmonioso, prende o seu Amor a um pedaço da sua carne, para que fiquem unos eternamente.

E se o seu amor voar por um momento?

Raiva!Temor!Angústia!

A escuridão de um só instante assombra um destino futuro igual.....É um presságio de fuga, vazio....o nada!

A alma perde-se , vagueia por dentro sem encontrar sentido! Entre os gritos estridentes do silêncio, a alma contorce-se , envolta numa penumbra de solidão. Geme na escuridão do Nada, pedindo em clemência pela melodia de um som caído neste vazio!

O Silêncio, Senhor da dor intemporal, Mestre do Suspiro da melancolia, assombra a Alma em desespero, que assim se envolve em lágrimas caídas no nada. Esta perde-se, isola-se na luz, fugindo da Dor que lhe afugenta a Vida...

Vive rodeado de medos e incertezas, o mundo parece-lhe precário e duvidoso, todos os caminhos que se lhe apresentam poderão ruir, por isso vive (sobrevive!) em permanente ciclo de dúvidas. Todos os passos que toma são encarados com receio, o olhar sobre o Futuro é incerto.

A labilidade paralisa-o, congela o devir, é o seu modo de vida! Um constante baloiçar, o temer pela seguinte queda no vazio. E a cada instante perde-se, confunde-se e torna-se sombra. Sente-se mal-compreendido, mal-amado e tão somente só! O mundo está eternamente em clivagem....

A sua vida assemelha-se á tarefa do trapezista, balanceando um pouco em cada passo que avança na corda da Vida (ou será Morte?), equilibrando-se e parando um pouco para vislumbrar a força que o sustem, olha todo o público lá longe....o medo assombra-o, está só naquela angustiante caminhada. Passo a passo oscila, o temor agita-o. Pensa, basta um pequeno deslize, um mero dispersar para que caia ali no vazio, na obscuridão....silêncio novamente!

Todo o público o admira, aplaude, mas nunca estarão suficientemente perto para o salvar, estão longe demais para o apoiar, para o tornarem seguro e vivo!

Caminha concentrado fobicamente na sua tarefa, ganhando força para continuar ao som de aplausos num segundo, e caindo no desespero no instante que se segue, quando compreende que a sua Vida está imortalmente entregue ao vazio e solidão.

Aos olhos do Borderline, o destino é sempre uma incógnita, algo quebradiço e precário, como uma fina camada de gelo, onde cada passo é dado em permanente reflexão, uma profunda análise de mudanças que possam ocorrer. Vivem agrilhoados a uma instabilidade toda a sua vida, – á qual Coimbra de Matos (2002), sabiamente chama "instabilidade estável"– a qual influencia vários domínios da sua identidade: escolhas profissionais e afectivas, a imagem que forma dos seus parceiros, a imagem de si mesmo, valores e gostos pessoais, identidade sexual e objectivos a longo prazo.

Tudo é encarado com incerteza, sendo constante a oscilação entre sentimentos antagónicos como amor/ódio; esperança/incerteza. Pois no mundo de um Borderline não existem “cinzentos”!

Estamos perante uma Perturbação de Personalidade que começa a manifestar-se no fim da adolescência e início da vida adulta. Na sua génese estão, geralmente, estilos educativos e ambientes familiares instáveis com situações traumáticas de abandono, abuso psicológico, maus-tratos e negligência.

São caracterizados por um padrão persistente de instabilidade que afecta as suas relações interpessoais, o seu humor e a sua auto-imagem. Têm pouco controlo sobre os seus impulsos.

Estão frequentemente presentes a maioria destas características:

1. Esforços frenéticos para evitar o abandono real ou imaginado – Intolerância à solidão.

2. Estabelecem relações interpessoais intensas e instáveis marcadas pela alternância entre idealização e desvalorização (Por um momento vê a pessoa como um Anjo, inteiramente Boa, para no outro se tornar num Demónio, cheia de más intenções).

3. Perturbação de identidade: instabilidade persistente e marcada da auto-imagem ou do sentimento de si próprio (num momento sente-se superior aos outros, num outro momento sente-se inferior e inútil, por ex.).

4. Impulsividade, em pelo menos duas áreas que são potencialmente autolesivas: gastos excessivos, abuso de substancias, condução agressiva, voracidade alimentar, etc.

5. Comportamentos, gestos ou ameaças recorrentes de suicídio ou comportamento automutilante.

6. Exuberantes manifestações de instabilidade afectiva, oscilando bruscamente entre emoções como o amor e ódio, entre a indiferença ou apatia e o entusiasmo exagerado, alegria efusiva e tristeza profunda.

7. Sentimento crónico de vazio.

8. Incapacidade de sentir prazer: nunca se sentem totalmente satisfeitos com nada.

É a patologia da insegurança, o borderline necessita de uma figura de protecção, a qual lhe faltou quando mais necessitou - na sua infância. Anseia pelo embalo, pelo amor que nunca chegou a sentir. Agora, busca incessantemente essa presença, e quando encontra uma qualquer figura ideal, investe e projecta nesta, criando uma relação de simbiose, visando mantê-lo permanentemente a seu lado. Há a emergência do amor perdido, por uma mãe e um pai presentes , que lhe dêem a segurança necessária para que cresça sendo ele mesmo, para que possa construir a sua própria identidade sem receios, e para que o Futuro lhe surja repleto de esperança.

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