Malditos Espelhos - Perturbações do Comportamento alimentar
Malditos espelhos!
Caminho a passos largos evitando todo e qualquer reflexo...fujo de mim mesma. Pedaços de imagens reflectidas espelham o meu (?) corpo. Repugna-me. Atormenta-me. E a culpa espreita. Malditos espelhos que me perseguem....que trazem toda esta angústia reflectida e carregam-me de mal-vindos pensamentos.
Numa sociedade, cada vez mais, exigente e ditada por ideais de perfeição, sentimo-nos pressionados e influenciados a seguir os modelos que nos impõem. Apesar de vivermos num mundo de diversidade, e de tantas campanhas pela não-discriminação e pela aceitação (Quem não se lembra da propaganda da Bennetton: «Todos diferentes, todos iguais»?), o apelo publicitário às formas 86-60-86, grita todos os dias em cada desfollhar de revistas/jornais, em cada anúncio que passa na televisão, em cada manequim das lojas de vestuário...trazendo-nos o sentimento de vergonha quando olhamos o reflexo no espelho, ou a culpa quando ousamos comer prazerozamente um hamburguer com todas as iguarias a que tem direito!
Inevitavelmente leva-nos a focar o nosso pensamento no corpo, detectando os seus “defeitos” e sonhando com os ideais a alcançar (menos barriga, pernas assim ou assado, rabo XPTO), planeando estratégias para atingir as metas definidas (apesar da procrastinação muitas vezes ganhar nesta batalha). Felizmente estes pensamentos vão e vêem pontualmente, quando despertados por alguma imagem utópica (que nos faz roer de inveja) com as suas formas platónicas, o que causa uma angústia subtil e transitória.
O problema surge quando estes pensamentos não descolam da nossa mente, envolvendo todo o nosso sentir e agir, implicando alterações na nossa qualidade de vida e afectando as esferas relacional, profissional/escolar, alimentar, corporal...
Nesse caso, estamos perante uma perturbação do comportamento alimentar, o que exige uma emergente procura de apoio de técnicos especializados, para que se possa intervir e restaurar o equílibrio emocional e pessoal.
Nas pertubações de comportamento alimentar ocorre uma alteração na forma de comportar em relação á alimentação, o que está relacionado com a percepção que o sujeito tem da sua imagem corporal e com crenças distorcidas e disfuncionais acerca de peso, do formato corporal, alimentação e valor pessoal.
As perturbações de comportamento alimentar mais incidentes são a Anorexia Nervosa e Bulimia Nervosa, as quais sucintamente passo a descrever:
Na Anorexia Nervosa há uma perda de peso associada a uma progressiva mudança de comportamento alimentar, o que pode ter inicio através de uma dieta normal ou de uma restrição alimentar brusca. É frequente ocorrer um isolamento social, deteriorando-se as relações familiares e pessoais, devido a um foco obssessivo na alimentação.
Podemos apontar como sintomas:
• Sintomas Físicos:
– Perda visível de peso;
– Dificuldade ao nível do sono;
– Dores de estômago;
– Perda de cabelo;
– Sensação de frio constante;
– Transtornos circulatórios;
– Menstruação irregular ou inexistente;
– Perda da força;
– Dores de cabeça, tonturas e desmaios;
– Palidez;
– Lanugo (penugem em todo o corpo);
- Poderá haver perda de menstruação.
• Sintomas Psicológicos:
– Distorção da Imagem Corporal;
– Alterações de humor, depressão, irritabilidade;
– Crenças erradas quanto ao peso;
– Procura constante do perfeccionismo;
– Perda de interesse pelas actividades normais;
– Isolamento;
– Interesse excessivo por comida, calorias e receitas;
– Dificuldade em concentrar-se;
– Auto-estima determinada pela ingestão ou não de alimentos;
– Culpa e/ou vergonha ao alimentar-se;
• Sintomas Comportamentais:
– Prática excessiva de exercício físico;
– Cozinhar para os outros, mas não comer;
– Frequentes desculpas para não comer (indisposição, refeição feita à pouco
tempo, etc.);
– Pesagens constantes;
– Vestir roupas largas;
– Práticas alimentares pouco comuns (cortar a comida em pedacinhos,
mordiscar os alimentos);
– Dificuldade em alimentar-se em público;
– Secretismo quanto a hábitos alimentares.
Todas estas alterações bruscas e constantes na vida do sujeito têm um alto risco associado, podendo provocar problemas de saúde que comprometem quer a qualidade de vida, quer a própria vida. Os riscos mais comuns são a fadiga e perda de energia; a ausência de menstruação ou menstruação irregular; a infertilidade; os problemas de pele; a desidratação; a falta de ar; os batimentos cardíacos irregulares;o inchaço nas extremidades;a prisão de ventre; o enfraquecimento e a queda de cabelo;os problemas de estômago;a osteoporose;os problemas de fígado e rins;o desequilíbrio dos electrólitos;a redução dos níveis de potássio (causa comum de paragem cardíaca);a anemia; e as perturbações de foro emocional (como a Depressão).
A Bulimia Nervosa afecta, sobretudo, mulheres no fim da adolescência e inicio da vida adulta (apesar de haver cada vez mais relatos de aumento de incidência em mulheres com 30, 40 e 50 anos). Na Bulimia Nervosa ocorrem momentos de grande voracidade alimentar (com a ingestão de grandes quantidades de alimentos), ao que se seguem momentos de grande culpabilização e vergonha, podendo levar a um período de restrição alimentar para compensar os estragos feitos anteriormente. Frequentemente recorrem a estratégias para perder peso ou evitar o seu ganho, após estes momentos de ingestão compulsiva, como o vómito auto-induzido, o jejum, o recurso a laxantes ou/e a clísteres ou a exercício físico intensivo.
Os sintomas mais frequentemente apresentados são:
Sintomas Físicos:
– Frequentes oscilações no peso;
– Garganta irritada e glândulas inchadas;
– Fadiga;
– Dificuldades a nível so sono;
– Irregularidade menstrual;
– Sinal de Russell;
– Vasos sanguíneos rebentados;
– Fraqueza muscular;
– Problemas dentários.
• Sintomas Psicológicos:
– Labilidade emocional;
– Depressão;
– Obsessão por dietas;
– Dificuldade de auto-controlo;
– Severa auto-crítica;
– Auto-estima determinada pelo peso;
– Medo de não conseguir parar de comer voluntariamente;
– Pensamentos de auto-censura depois de comer;
• Sintomas Comportamentais:
– Ingestão de grandes quantidades de alimentos;
– Indisposição após as refeições;
– Idas à casa de banho logo após a refeição;
– Comer às escondidas;
– Abuso de laxantes, substâncias para emagrecer e diuréticos;
– Uso de clísteres;
– Induzir o vómito;
– Isolamento;
– Exercício físico em demasia;
– Jejum prolongado e frequente;
– Fuga a restaurantes, refeições planeadas e eventos sociais.
Similarmente á Anorexia Nervosa, também nesta perturbação há um risco elevado de distúrbios que poderão afectar gravemente a saúde, nomeadamente:
- Cansaço e perda de energia;
– Menstruação irregular ou inexistente;
– Dores de cabeça e tonturas;
– Desidratação;
– Prisão de ventre e diarreia;
– Falta de ar;
– Batimentos cardíacos irregulares;
– Queda de cabelo;
– Inchaço e dores de estômago;
– Perda do esmalte dentário e cáries;
– Irritação crónica da garganta;
– Problemas de fígado e rins;
– Aumento da glândula parótida;
– Desequilíbrio hidroelectrolítico;
– Mãos e Pés inchados;
– Úlceras;
– Dilatação e ruptura gástrica;
– Escoriações nas mãos e articulações;
– Anemia;
- Depressão e ansiedade;
– Paragem cardíaca e morte.
É importante salientar que nestas perturbações, dados os riscos elevados para a saúde física e mental, é impriscindível uma intervenção atempada e multidisciplinar (Psicólogo, Psiquiatra, Nutricionista, Médico de Família, etc.):
- Psiquiatras: Garantir o tratamento psiquiátrico por psicofarmacoterapia;
- Psicólogos: Psicoterapia individual, terapia, orientação familiar, terapia cognitivo-comportamental;
- Nutricionista: reabilitação nutricional, recuperação de peso, cessação de comportamentos para perda de peso, melhoria dos hábitos alimentares;
- Médico: Supervisionar as alterações de saúde através de exames complementares regulares. Intervir sobre eventuais problemas de saúde decorrentes dos comportamentos desta perturbação.